A expressão “arquitetura vernácula” tem origem no termo latino vernaculus, derivado de verna, que designava o escravo nascido na casa do senhor. Inicialmente, o vocábulo indicava aquilo que era nativo, doméstico, próprio do lugar. Com o passar do tempo, o termo assumiu novos significados, sendo utilizado para designar a língua, os costumes e as expressões culturais próprias de um país ou região, em oposição ao que é estrangeiro. Em sentido figurado, vernáculo passou a significar uma linguagem pura, castiça, desprovida de estrangeirismos — ou seja, algo genuíno e autêntico( WEIMAR, 2022)
Como destacam Santos, Rezende e Cabral (2020)
"estudar o vernáculo implica reconhecer que “os modos tradicionais de construção devem ser compreendidos para além das edificações”, abrangendo os significados culturais, as práticas comunitárias e os vínculos identitários que lhes dão origem. O conceito de vernáculo está, portanto, intrinsecamente ligado à ideia de pertencimento e à produção de um espaço existencial. "
(SANTOS, REZENDE E CABRAL,2020)
Ainda ,Tofani e Brusadin (2021) apontam que
"as arquiteturas vernáculas devem ser entendidas “menos como produtos e mais como processos”, pois resultam de um sistema cultural e ambiental indissociável. Cada técnica construtiva, material ou forma adotada pelas comunidades tradicionais reflete uma resposta direta às necessidades coletivas, ao clima, à paisagem e à economia local.
(TOFANI , BRUSADIN, 2021)
Assim, o uso do termo vernáculo na arquitetura deve ser compreendido como reconhecimento de um modo de construir enraizado no território, determinado por fatores ambientais, sociais e econômicos que ilustram os elementos culturais de uma comunidade.
A arquitetura vernácula, portanto, pode ser colocada como a produção edificatória desenvolvida por pessoas que, mesmo sem formação técnica, detêm profundo conhecimento prático sobre o ambiente em que vivem. É uma forma de arquitetura adaptada ao clima, à topografia, aos materiais disponíveis e aos modos de vida de cada grupo social. (WEIMAR,2022).
No Brasil, o conceito de arquitetura vernácula ganha sentido especial por refletir a pluralidade cultural e a formação social híbrida do território. As construções vernáculas brasileiras sintetizam saberes indígenas, africanos e europeus, traduzindo-se em práticas construtivas que valorizam a simplicidade, a adaptabilidade e o uso racional dos recursos naturais. Weimar (2022) destaca que
“a primeira característica da arquitetura popular brasileira parece ser a sua simplicidade, por ser resultado da utilização dos materiais fornecidos pelo ambiente”.
(WEIMAR, 2022)
A aparente simplicidade deriva menos da ausência de recursos técnicos e mais de uma inteligência construtiva prática, moldada pelas limitações e potencialidades do meio embasadas pelos saberes de uma comunidade .
A segunda característica apontada por Weimar (2022) é a adaptabilidade, entendida como a capacidade de ajuste dinâmico entre construção, ambiente e modo de vida. Essa adaptabilidade, que se expressa tanto nas técnicas construtivas quanto na organização dos espaços, garante a sobrevivência e a atualidade das arquiteturas populares, mesmo diante de processos de modernização e transformação cultural. A produção popular não se define por oposição à erudita, mas por sua autonomia simbólica e prática, fundada na experiência coletiva e na observação sensível do meio. Trata-se de uma arquitetura que traduz o saber do povo, resultante da transmissão oral de técnicas.
A arquitetura vernácula e popular é reconhecer o valor de um conhecimento ancestral que articula natureza, cultura e território. Mais do que simples edificações, essas obras constituem testemunhos vivos de identidade e pertencimento, nas quais se materializa a memória coletiva e a continuidade dos modos de vida tradicionais.
TOFANI, Frederico de Paula; BRUSADIN, Leandro Benedini. A arquitetura vernácula enquanto patrimônio cultural: contribuições para sua preservação e uso sustentável. UFMG / UFOP, 2021.
SANTOS, Maxiliano; REZENDE, Marco Antônio; CABRAL, Mariana. Arquitetura vernácula e memória: abordagem metodológica para investigação. Universidade Federal de Minas Gerais.